Deus: um agiota severo

Sempre compreendi a importância e a cobrança do dízimo por parte das igrejas. Sei também que há uma justificativa bíblica para sua existência e obediência. No entanto, o que me chama a atenção é a ferocidade com que as mais variadas religiões e igrejas o cobram.

É o dinheiro arrecadado a partir do recolhimento do dízimo e de outras doações – dinheiro esse livre de impostos, na maioria dos casos – que permite a manutenção e construção de novos templos, a implantação de serviços comunitários, o patrocínio de atividades de catequese e outras coisas mais. Não duvido disso.

Mas a mercantilização da fé é realmente constrangedora: é comum ver os mais variados pregadores cobrarem de maneira embaraçosa a seus fiéis, atribuindo-lhes culpa quando as arrecadações são miúdas, no que se lhes impõem os malogros do grupo religioso a que pertencem, bem como os de sua vida pessoal. Quem nunca ouviu um pregador dizer que a vida de um sujeito anda mal porque ele não observa as leis de Deus e não recolhe o dízimo como deveria?

É esse jogo de mercado, essa cobrança dura e mesquinha que me faz pensar que as religiões apresentam Deus como um agiota severo e sem compaixão. Se as pessoas querem felicidade, bons empregos, sucesso, saúde e amor, paguem o dízimo, “contribuam com a obra de Deus”. E se essas benesses não vêm, é porque faltou fé e, claro, “generosidade” no pagamento do dízimo.

Pelo jeito, Deus não faz nada de graça.

Já ouvi absurdos como “já temos o dinheiro para a reforma de nossa igreja e ele está no bolso de cada um de vocês” ou ainda “se você recolhesse o dízimo direitinho, essas coisas não aconteceriam”. Há pregadores que se comportam como os cães de aluguel divinos.

Obviamente, o dízimo é um oferecimento feito pelo seguidor de uma religião por sua própria vontade, ainda que seja constantemente impelido a fazê-lo, às vezes de maneira constrangedora.

Mas me pergunto se é mesmo necessário mercantilizar tudo, estabelecer preços para quaisquer obras: batismo a 45 reais, casamentos a 100, 10% da receita bruta, venda de missas, terrenos no céu, fogueiras santas, estabelecimento de metas comerciais, quermesses, festas de arrecadação, shows gospel, louvores e retiros pagos, etc. Há preço, cobrança e lucro em cima dessas atividades. Lucro, essencialmente. E dever às igrejas é um risco, porque a cobrança é deveras pesada e o cobrador muito poderoso.

8 comments

  • Esse tipo de cobrança torna a religião muito parecida com um comércio de prestação de serviços. Não apenas no que diz respeito ao dízimo, mas também com relação à postura do fiel frente à instituição religiosa, aos representantes da religião e à própria divindade, quando é o caso. O tipo de relação "faça-me isso que te dou isso", "Ame somente a mim, do contrário te faço sofrer", e promessas desse naipe. Uma relação fundamentada nesses termos dificilmente pode ser associada à noção que muitos de nós idealizamos da palavra amor, noção essa em geral atribuída aos deuses em geral. Penso: será que interpretamos a ideia de "amor" da forma correta? Ou terá algo de podre no reino do jardim do éden?

  • É o caixa-eletrônico da salvação, só que você deposita o dinheiro na conta de Deus e "recebe" as bênçãos. Se os depósitos param, a bênção para também. Bem simples.

    Ótimo texto.

  • Acredito em Deus, mas confesso, me sinto feliz em contribuir financeiramente com duas instituições que cuidam de pacientes com câncer. E isso nada tem a ver com religião. O Deus que acredito jamais me cobraria um único centavo. Bom, tenho uma imagem muito particular de Deus, levando em consideração a legião de pessoas que se são obrigadas por líderes religiosos a sustentá-los.

    • Contribuo financeiramente com a APAE, porque há crianças que precisam dessa ajuda e não porque um ser superior quer que eu o faça.

      Sua visão a respeito de Deus, Otávio, difere da visão de muitas pessoas. O Deus que muita gente procura é um que resolva seus problemas sem que precisem fazer nenhum esforço pessoal.

  • São todos hipócritas, antes de responderem ao que vou falar, pesquisem o que significa.

    As instituições religiosas, em suas inúmeras representações, não são a representação da divindade, pelo menos as protestantes, as que entendo melhor, as demais, desconheço, ou seja, os atos dos homens não podem ser atribuídos a Deus, muito pelo contrário, existe o livre arbítrio, a igreja e nada mais do que reunião de pessoas em face de celebrar, estudar, reunir-se, louvar, dentre outras manifestações as obras de Deus, mas não são perfeitas, assim, como as Universidades, os Estados, ONG e demais, precisam serem financiadas para seu proposito maior, sua existência.

    Quando os médicos não tem solução para o problema, onde procurar? Amigos, ainda acreditam que isso aqui é só que nós esperam? Pobres almas.

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