Serviço público

O serviço público sempre serviu de piada para a sociedade brasileira. O excesso de burocracia, a falta de igualdade no tratamento do público, a ineficiência, a lentidão, os favorecimentos e favorecidos, as manobras inescrupulosas e a corrupção sempre foram elementos facilmente associados às atividades da máquina pública no país. Desde seu surgimento até os dias de hoje.

É verdade que todas essas características não são atribuições esvaziadas de sentido ou puramente míticas: a política brasileira, ponto máximo do serviço público, vive em quase total descrédito diante da população e ilustra perfeitamente a situação.

No entanto, se as práticas historicamente têm sido essas, também é certo que nos últimos anos tem havido uma corrida para diminuir as desigualdades e possíveis diferenciações de tratamento. Teoricamente, ao menos. Muito tem se falado em isonomia e equanimidade como metas e características do serviço público nacional. Esse novo comportamento tem diminuído, em alguma escala, a brutalidade dos escândalos a que nos acostumamos, ainda que estejam infinitamente longe de cessarem por completo.

O que se pode notar diante desse estreitamento das beiradas por onde as pequenas e grandes corrupções vazam, é que a maneira de processá-las, de permiti-las ou mesmo criá-las tem se tornado mais sofisticada: se não se pode mais nomear arbitrariamente um servidor público, por um lado, pode se criar chances e favorecimentos – quando de interesse dos membros mais graúdos dos grupos que gerem “a máquina” – de modo mais discreto, com manobras sofisticadas e legais, mesmo que imorais ou questionáveis e obscuras.

Aos que não têm “padrinhos” – palavra comum no universo do funcionalismo público nacional durante anos, e que ainda não se perdeu por completo – a lei reserva-se rigorosa e exigente, intransponível. Àqueles que têm quem lhes ache as brechas legais, reservam-se as facilidades e possibilidades dos códigos.

Por isso o jogo da imoralidade e improbidade na esfera pública está ainda muito longe de sua última cartada. Se antes, as regras eram quebradas com golpes na mesa e baralhos de cinco naipes, hoje elas têm a sutileza e os cálculos de um pôquer em que a mão sempre favorece os escolhidos.

O serviço público não joga mais truco, não grita mais, salvo em alguns momentos: as grandes instituições públicas preferem, atualmente, as possibilidades e sofisticações do 21. Sonhar com um jogo de cartas na mesa guarda ainda distância imensa da realidade, porque os jogadores sabem bem como burlar a banca.

4 comments

  • Somente na "Teia Neuronial" ha tecelão dessa qualidade. O resto é pirataria. Parabéns amigo Theo por expressar o descontentamento dos brasileiros honestos.

  • Sou servidora pública há 28 anos. E não vejo certos tratamentos diferenciados ao público, necessariamente, como problema. No entendimento que, conforme a representatividade da pessoa atendida, há uma demanda diferente. Se há um interesse particular envolvido, que beneficiará poucas pessoas, recebe um tipo de atenção mais limitado. Mas, se o impacto das decisões, se estenderão sobre um maior número de pessoas, o cuidado necessário requer mais trabalho. Representantes legítimos dos interesses do povo, inserem-se nesta categoria. No eterno exercício da pólis cidade, debatendo os interesses da coletividade, na tradição de se encontrar na ágora reunidos, desde os primórdios da humanidade.

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