O problema ideológico da Primeira Diretriz
Desde sua concepção, Star Trek se constituiu como uma referência de valorização da diversidade humana nas mídias áudio-visuais. As tripulações das naves são sempre multiétnicas e multirraciais (contêm indivíduos de espécies não-humanas) e os temas de grande parte dos episódios tratam de questões relativas ao poder e à exploração de um povo sobre outro, seja de ordem social, econômica, política ou cultural, e suscitam discussões críticas sobre os limites da representatividade de gênero, de grupos étnicos, de sexualidade e de pessoas fora do padrão capacitista – mesmo que essa crítica seja para denunciar a falta dessa representatividade na franquia.
O fato é que a utopia proposta por Star Trek é repleta de falhas e contradições com seus próprios princípios, como a falta de personagens LGBT num universo que supostamente convive bem com a diversidade humana e extra-humana. Isso não se deve, é claro, à má intenção dos criadores, roteiristas e produtores (entre os quais houve diversas tentativas, desde a Série Clássica, de se inserir personagens fora dos padrões heteronormativos), mas sim a sua limitação cultural. Tanto é assim que o alcance da representatividade na franquia tem mudado com o passar do tempo, refletindo mudanças de mentalidade.
Mas uma das coisas que não mudaram significativamente foi a noção e a função da “Primeira Diretriz” (“Prime Directive”). Ao longo de toda a franquia, a Frota Estelar enfrenta diversos dilemas éticos envolvendo essa regra, também conhecida como Ordem Geral da Frota Estelar Número Um (Starfleet General Order 1). Resumidamente, essa regra proíbe os oficiais da Frota Estelar (e em alguns contextos os cidadãos da Federação Unida de Planetas) de interferir no curso “natural” de desenvolvimento de sociedades que ainda não possuem conhecimento de inteligência alienígena ou não desenvolveram tecnologia de dobra (que permite viagens interplanetárias).
Porém, as noções de “curso natural de desenvolvimento” e da relevância da tecnologia de dobra como marco universal para uma certa etapa da história de um povo são arbitrárias e baseadas numa visão específica da História, a dos idealizadores, produtores e escritores dessas narrativas, todos pertencentes, de maneira geral, à cultura ocidental. Tendo em vista esse cenário (fictício e real), proponho uma reflexão a respeito do possível viés da Primeira Diretriz, considerando que não se trata de um conceito puramente lógico nem inequivocadamente racional, mas sim uma construção baseada numa determinada percepção do passado e numa determinada visão futurista.
As nuanças da exploração
Uma das principais justificativas para a existência da Primeira Diretriz pode ser resumida numa citação do Capitão Jean-Luc Picard, que comanda a nave estelar Enterprise-D. na série Jornada nas Estrelas: A Nova Geração (Star Trek: The Next Generation). Esse discurso, proferido no episódio “Simbiose” (“Symbiosis”, TNG T01E22), resume bem os principais motivos para a existência dessa diretriz:
A Primeira Diretriz não é só um conjunto de regras; é uma filosofia… e uma filosofia muito correta. A História já provou várias vezes que sempre que a humanidade interfere numa civilização menos desenvolvida, não importa quão bem intencionada seja essa interferência, os resultados são invariavelmente desastrosos.
[The Prime Directive is not just a set of rules; it is a philosophy… and a very correct one. History has proven again and again that whenever mankind interferes with a less developed civilization, no matter how well intentioned that interference may be, the results are invariably disastrous.]
Picard se refere, obviamente, à história humana e às diversas vezes em que o contato entre duas ou mais sociedades e/ou culturas provocaram prejuízos como desagregação, genocídio e exploração humana. De fato, se tomarmos episódios como a expansão do Império Romano pela Europa e partes da Ásia e da África, o domínio egípcio sobre a região banhada pelo Nilo, o estabelecimento do Império Asteca na região hoje conhecida como México e os diversos pontos do planeta conquistados pelas nações europeias, temos alguns de inúmeros exemplos daquilo contra o qual o Capitão Picard está se posicionando.
Porém, por mais bem-intencionada que seja a Federação, a Frota Estelar e os idealizadores das narrativas fictícias de Star Trek, o argumento cai num certo truísmo: ao nos fazer concordar que vários tipos de violência foram cometidos no passado (e realmente o foram), em situações de contato entre civilizações, Picard nos induz a acreditar que qualquer tipo de contato está sujeito a terminar tragicamente. Seguindo essa linha de raciocínio, acabamos incorrendo no erro de ignorar que os contatos entre civilizações dos quais Picard nos fala já eram, na maioria das vezes, corrompidos em suas motivações. Não se trata, portanto, de qualquer contato; não existe aqui a possibilidade de se considerar que as tragédias provocadas por choques de civilizações foram acidentais ou fruto de mal-entendidos. Tais contatos foram motivados pelo desejo de um povo para explorar o outro. Todos os exemplos humanos citados acima foram empreendimentos imperialistas.
Essa omissão constitui o primeiro problema da Primeira Diretriz. Em suma, os “resultados desastrosos” para os quais alerta Picard são os frutos de contatos entre civilizações que se fizeram motivados pela colonização, pela exploração e pela conquista. Essas motivações não estão na base dos interesses da utópica Frota Estelar, que não usa a palavra “exploração” em seu sentido anti-humanitário (em inglês: “exploitation”, imposição da servidão ou da escravidão), mas sim em seu sentido desbravador (“exploration”), para a aquisição de conhecimento e de recursos inanimados. Dessa forma, aludir aos desastres históricos cometidos por civilizações que se utilizaram da violência contra outros povos não faz sentido. A Federação já superou a necessidade de conflitos e de exploração de pessoas, e ela poderia muito bem estabelecer contato com povos recém-encontrados e aos poucos ir trocando conhecimentos e saberes culturais, enriquecendo a ambos os lados do contato.
Uma diretriz ideológica
O que nos leva para o segundo problema, que é a ideia de que um contato entre duas culturas tecnologicamente díspares provocaria um choque muito grande naquela que for mais “primitiva”, como se esta visse na outra algo sobrenatural, como se os “nativos” tendessem a interpretar os exploradores “civilizados” como seres divinos. Essa ideia está expressa na citação de Arthur C. Clarke evocada pelo Capitão Picard e pelo Capitão Pike:
“Qualquer tecnologia suficientemente avançada é indistinguível da magia.”
[Any sufficiently advanced technology is indistinguishable from magic.]
Há múltiplas maneiras de se interpretar essa citação, que é a terceira das “três leis de Clarke”, mas em Star Trek ela foi invocada com um sentido bem específico. Tanto Pike quanto Picard assumem que essa lei se aplica a situações em que uma sociedade “primitiva” supostamente considerará a tecnologia de uma sociedade “avançada” como sendo magia, e ambos saltam para a conclusão de que os membros de um povo que possui tal tecnologia serão confundidos com deuses.
Considero que há um viés ideológico subjacente à concepção da Primeira Diretriz. Para deixar nítido, quando uso a palavra “ideológico”, estou me valendo de seu estrito sentido científico-filosófico e não de uma difusa noção apregoada por discursos políticos hoje em dia. Ideologia, no sentido engendrado por Karl Marx e Friedrich Engels e desenvolvido pelo pensamento marxista, é o conjunto de mecanismos simbólicos e discursivos que servem para fazer parecer eterno e natural aquilo que é construído historicamente, justificando dessa forma qualquer status quo e qualquer relação de dominação.
Qual seria então esse viés ideológico? Ao pensar que determinados povos considerariam como “magia” uma tecnologia “mais avançada”, ignora-se que essa narrativa é desde sempre construída através do olhar do colonizador que se impõe pela força sobre outros povos. Uma abordagem crítica sobre esse problema pode ser construída a partir do debate entre os antropólogos Marshall Sahlins e Gananath Obeyesekere. O primeiro, norte-americano, considera que os havaianos haviam confundido o Capitão Cook com um deus de seu panteão, enquanto o segundo, srilankês, questiona se os ocidentais são capazes realmente de compreender o pensamento de outros povos a ponto de chegar a conclusões como essa. Não temos, de fato, registros de narrativas feitas pelos povos colonizados sobre os invasores de suas terras. Por outro lado, é bastante conveniente, para aqueles que subjugam, pensar que a “ingenuidade” dos subjugados facilitou a conquista ou até foi esperada por estes.
É preciso desconstruir a clássica narrativa do índio que se maravilha com o espelho do navegador europeu, as histórias em que um povo “ingênuo” e “primitivo” confunde tecnologias “avançadas” com magia e vê os estrangeiros como criaturas fantásticas ou divinas. Por um lado, esse tipo de narrativa encontra respaldo no maravilhamento comum a qualquer contato com povos estrangeiros, línguas desconhecidas, tecnologias com formas e usos estranhos, que levam a entender mal a cultura do outro. Os próprios navegadores europeus, inclusive, foram “vítimas” desses desentendimentos interculturais e deslumbramentos com o exótico. A tripulação de Vasco da Gama, por exemplo, ao chegar na Índia e ver imagens das divindades do Hinduísmo, pensou se tratar de representações dos santos católicos, enquadrando num esquema teológico familiar aquilo que consideraram estranho. Os costumes dos povos estrangeiros sempre ativam nosso etnocentrismo, que nos faz tratá-los como coisas extraordinárias.
A ”necessidade” de povos “primitivos” serem tutelados por povos “civilizados” marcou grande parte dos discursos colonialistas. O Orientalismo, por exemplo, estudado por Edward Said, elaborou uma complexa e exótica imagem para representar os povos do “Oriente”, vistos pelos europeus como bárbaros, incultos, ingênuos, supersticiosos, animalescos e sexualizados. A intervenção da civilização europeia, para os pensadores orientalistas, era entendida como um favor da parte de um povo mais “evoluído” para com um povo “atrasado”, ajudando a este em sua “evolução”.
A própria franquia faz uma crítica interessante dessa visão paternalista num dos episódios mais icônicos da Série Clássica, “Missão de Misericórdia” (“Errand of Mercy”), no qual a Frota Estelar e o Império Klingon disputam a tutela de um povo “primitivo” que não pediu por nenhuma intervenção externa. No fim, descobrimos que na verdade os organianos não só não precisavam de tutela como eram capazes de evitar qualquer tipo de violência contra si mesmos, bem como impedir que os outros se ferissem entre si.
O discurso orientalista era (e ainda é) uma manifestação do pensamento evolucionista. O Evolucionismo Cultural, junto com o Racismo Científico, foi utilizado para justificar a colonização e administração de outros povos, seja na América, na África ou na Ásia. Tudo era baseado na noção de que existe uma só Cultura/Civilização humana (o termo alemão Kultur se refere aos dois termos, “cultura” e “civilização”). Nessa noção, cada povo humano poderia ser classificado segundo uma escala gradativa que partiria da “selvageria”, passando pela “barbárie”, e chegaria até a “civilização”. Esta era considerada como a realização máxima do potencial humano, e coincidia com a cultura europeia, que foi justamente a cultura que concebeu essa ideia.
Período | Fase | Características |
---|---|---|
Selvageria | Período inicial Status inferior | Da infância da raça humana até o começo do próximo período |
Período intermediário Status intermediário | Da aquisição de uma dieta de subsistência à base de peixes e de um conhecimento do uso do fogo até etc. | |
Período final Status superior | Da invenção do arco-e-flecha até etc. | |
Barbárie | Período inicial Status inferior | Da invenção da arte da cerâmica até etc. |
Período intermediário Status intermediário | Da domesticação de animais no hemisfério oriental e, no ocidental, do cultivo irrigado de milho e plantas, com o uso de tijolos de adobe e pedras, até etc. | |
Período final Status superior | Da invenção do processo de fundir minério de ferro, com o uso de ferramentas de ferro, até etc. | |
Civilização | Civilização | Da invenção do alfabeto fonético, com o uso da escrita, até o tempo presente. |
Adaptado de: CASTRO, Celso (org.). Evolucionismo cultural: textos de Morgan, Tylor e Frazer. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005. p. 60. |
Outro indício de que Star Trek possui em suas bases um espírito evolucionista é o tropo comum em diversas histórias de Ficção Científica de que espécies inteligentes e civilizadas em outros planetas se desenvolvem de maneira análoga ao ser humano terrestre (ou melhor, ao modelo ocidental de ser humano). Muitas das espécies extraterrestres encontradas nas histórias de Star Trek são fisicamente iguais aos seres humanos ocidentais, se comunicam da mesma maneira e têm uma cultura material (roupas, utensílios e máquinas) bastante semelhante. Só raramente se concebe uma espécie inteligente que foge desse modelo evolucionista, um modelo teleológico segundo o qual a inteligência e a “civilização” seguem universalmente as mesmas leis.
A representação de povos alienígenas é tão fortemente marcada por essa noção que em alguns casos as narrativas de Star Trek utilizam estereótipos daquilo que se considera “primitivo” para apresentar esses povos. No episódio “Síndrome do Paraíso” (“The Paradise Syndrome”), da Série Clássica, a tripulação da Enterprise encontra um grupo de ameríndios vivendo em outro planeta, mantendo os mesmos costumes e visão de mundo de séculos atrás. Aqui, o racismo para com os povos indígenas se encontra com a concepção de um povo fictício pensado para servir como recurso narrativo de uma história sobre a intervenção de um povo tecnologicamente “avançado” sobre o destino de um povo “primitivo”.
A Antropologia Cultural, iniciada por Franz Boas, superou a noção de “primitividade” e “avanço” ao apresentar a ideia de que cada cultura tem sua própria história e não pode ser analisada pelos critérios de outra. Ver nos indianos, por exemplo, um estágio cultural inferior ao dos alemães seria um reducionismo que ignora a dinâmica própria a cada sociedade em particular.
Coaduna-se com a visão evolucionista da cultura a noção presente no universo de Star Trek de que em algum momento de sua história cada povo desenvolverá a tecnologia de dobra e consequentemente será capaz de contatar espécies alienígenas. Porém, ao considerar que a presença de tecnologia de dobra em uma sociedade é pré-requisito básico para o estabelecimento do contato, perde-se de vista que essa presença não implica necessariamente em uma sociedade pacífica e/ou igualitária, nem sua ausência implicaria numa cultura fechada aos desenvolvimentos tecnológicos espaciais. A própria franquia tem exemplos de sociedades com tecnologia de dobra que são belicistas, racistas e imperialistas, como os klingons em certo momento de sua história, os romulanos e os cardassianos. Os ferengi, embora nunca tenham se envolvido com guerras interplanetárias, eram extremamente sexistas até determinado momento de sua história.
Deuses do espaço sideral
Os próprios humanos “pré-dobra”, em episódios de viagem no tempo, se mostram abertos à ideia de seres extraterrestres que viajam pelo espaço sideral. Da mesma maneira, há indivíduos de culturas “pré-dobra” que compreendem a tecnologia avançada da Frota Estelar como algo diferente de magia, como Saru entre os kelpien, em Star Trek: Discovery. E se alguns indivíduos percebem os alienígenas dessa forma, não há motivos para pensar que sua sociedade não esteja aberta a esses conhecimentos.
A ideia de que “alta tecnologia” pode ser confundida com “magia” (e extraterrestres com deuses) pode estar perigosamente irmanada à visão evolucionista que ainda está em vigor no pensamento ocidental e que embasa ideias mirabolantes como a dos “deuses astronautas”, defendida por escritores como Erich von Däniken. A premissa de seu livro Eram os Deuses Astronautas? é basicamente a pré-noção de que o ser humano “primitivo” ou antigo é incapaz de realizar grandes obras sem a ajuda de um povo com tecnologia mais “avançada”. Nessa visão, apenas povos com tecnologia moderna e pós-industrial poderiam erguer monumentos como as pirâmides egípcias ou desenhar grandes imagens como as linhas de Nazca. Ainda segundo Däniken, o contato de seres extraterrestres com humanos “primitivos” foi o responsável pela criação dos mitos sobre criaturas divinas e sobrenaturais.
Os deuses astronautas evolucionistas e colonialistas que “ajudam” um povo “primitivo” a evoluir são a outra face da moeda da Federação que decide “não interferir” com o “desenvolvimento” de uma sociedade menos “avançada”. A visão que essa organização interplanetária tem de si mesma é a representação de uma cultura capaz de levar profundas modificações a outros povos e decidir os rumos de seu desenvolvimento e tomar as rédeas de seu destino. A Primeira Diretriz é uma manifestação dessa mentalidade.
Por uma diretriz razoável
É pertinente que uma cultura que se veja numa posição de poder coloque-se o questionamento sobre suas atitudes diante de outras culturas, e essa é uma boa razão para se pensar numa diretriz como a que vemos em Star Trek. Mas, se a Primeira Diretriz tem seu valor, é no sentido de servir à proteção de sociedades vulneráveis à exploração por outras povos. Para que ela seja realmente relevante, deve enfatizar os perigos desse tipo específico de contato.
Voltando à citação do Capitão Picard no início do texto, é pertinente o fato de que o episódio em que aquela fala foi dita lidou com a Primeira Diretriz de maneira bem mais interessante do que a maioria das vezes em que ela é invocada. Não se tratava, no caso, de evitar ou não um contato, já que a sociedade em questão possuía tecnologia de dobra, mas sim de intervir ou não na estrutura de poder entre duas populações, uma das quais fornecia regularmente à outra uma droga viciante como se fosse um remédio, em troca de outras tecnologias.
Penso que a Primeira Diretriz não deveria servir para impedir o contato, e sim para guiar os oficiais da Frota até sua realização. Essa diretriz poderia ter como passo inicial, como primeira etapa de seu fluxograma, a pergunta sobre a pertinência ou a necessidade de se estabelecer o contato com a sociedade de determinado planeta. Em muitos casos, este poderia ser benéfico para ambos os lados.
Um bom motivo, por exemplo, para não estabelecer contato com determinada sociedade é a possibilidade de haver incompatibilidade fisiológica entre as duas ou mais espécies envolvidas. Uma delas poderia ser tóxica para outra ou os micro-organismos que carrega poderiam causar doenças incuráveis. Este é um tipo de problema de contato entre culturas que aconteceu e acontece entre povos humanos da Terra e que justificaria o cuidado preconizado pela Primeira Diretriz.
Outra boa justificativa para a cautela no primeiro contato seria a possibilidade de uso das tecnologias da cultura alienígena (tanto a que chega quanto a nativa) para fins antiéticos (segundo a ética, no caso, da Frota Estelar), como a guerra ou a escravidão. Se a Frota Estelar é um braço da Federação e se esta se pauta em ideais pacifistas e igualitários, faz sentido que tente evitar ao máximo que povos em estado de conflito e marcados por desigualdades sociais recrudesçam esses problemas. Nesses casos, deixar que uma sociedade resolva seus próprios conflitos internos pode ser uma melhor opção do que arriscar um desastre maior.
Ao longo de toda a franquia, há diversas histórias interessantes de contato entre as espécies que poderiam ser aproveitadas como antecedentes para o aprimoramento da Primeira Diretriz, tal como o encontro entre humanos e vulcanos. Estes passaram muito tempo, após o primeiro contato, relutando em ajudar a humanidade no desenvolvimento da tecnologia de dobra, pautando essa relutância em preconceitos racistas. No final, os próprios humanos se mostraram cruciais para a sobrevivência das espécies do Quadrante Alfa e para a consolidação da Federação Unida de Planetas.
Nesta crítica, feita por um fã de Star Trek, não considero que o viés ideológico seja proposital por parte dos criadores, roteiristas e diretores da franquia. Pelo contrário, as ideologias nunca são perpetuadas conscientemente, e essa é uma de suas características. A ideia da Primeira Diretriz é bem-intencionada e condizente com o futuro utópico imaginado por Gene Roddenberry, quando a preocupação com a preservação das especificidades identitárias dos povos será parte do ideário mais libertário que esperamos alcançar. Essa é uma crítica que se estende para toda a franquia, que, mesmo apregoando ideais pró-diversidade e semiculturalistas, ainda tem em seu DNA uma visão do mundo ocidental e evolucionista. Portanto, não há mais espaço para romantizações que veem nas sociedades de organização mais simples uma ingenuidade mágica que pensa nos outros povos como “deuses”. Espero que em breve a franquia possa superar esse problema, assim como vem superando, desde seu início, a falta de representatividade étnico-racial, de gênero e de pessoas LGBT.
5 comments
Foi como eu comentei num texto sobre capacitismo, nós não estamos vendo a humanidade do século XXIV por uma máquina do tempo, nós estamos vendo nossa própria sociedade atual retratada como um povo do futuro que (supostamente) resolveu todas as suas diferenças e pra isso se utiliza de metáforas pra tratar de vários temas. Ela vai ter todos os nossos defeitos e virtudes de hoje.
Concordo que não foi proposital da parte dos criadores, pois isso faz parte do imaginário coletivo e nós ainda não evoluímos o suficiente pra mudar os primeiros contatos. A Federação distorceu a regra como quis, só a gente lembrar da transferência forçada dos Ba’ku que já estava pronta pra acontecer no filme Star Trek Insurreição. E esses dilemas precisam ser mostrados que é pra forçar o espectador a refletir.
Mas poderíamos ter discussões maiores a respeito da Primeira Diretriz, isso sem dúvida faltou ao longo dos mais de 700 episódios das séries, que conseguiram discutir muitas coisas. Poderia haver uma comissão da Federação pra se discutir as normas, em especial com povos tão diferentes do padrão humanoide.
Se o filme A Chegada nos mostrou algo é que até entre povos tão diferentes ainda é possível estabelecer uma conversação.
Realmente é sempre bom lembrar que a ficção é uma forma de revelar a realidade atual. Com o passar do tempo, Star Trek sempre mudou e sempre continuará mudando.
É tanta coisa que esse tema suscita que depois de publicar o texto continuam vindo outras ideias para desenvolver, especialmente as que são provocadas por comentários pertinentes como o seu. Quem sabe não surja uma continuação…
Thiago, excelente! É um daqueles raros casos que uma simples busca no Google (sobre a Primeira Diretriz, no meu caso) te leva a descobrir um texto tão bem escrito. Comecei a te seguir no Twitter e salvei o site também.
Estou empolgado por encontrar outras pessoas pensando nessas coisas. Tenho procurado escrever sobre esses pressupostos ocultos, ideológicos, não somente em Jornada na Estrelas, mas na FC como um todo. Deixo aqui meu humilde blog. Nem de longe é tão bem escrito, claro, mas talvez seja de interesse. http://tavernadesmade.blogspot.com
Que texto maravilhoso! Bate com muito do que penso e sinto, pois, sou um estudioso da ufologia e espiritualidade e posso afirmar que a humanidade já vive numa servidão arquitetada por seres negativos. Mas, independente disso ser real ou fantasia, pois não sei até onde o autor ou autora desse texto vislumbraria tal conclusão, vamos considerar, que, de fato, vivemos num tipo de matrix criada por reptilianos ok?
Eu sigo uma página no Youtube, dessas que fala de espiritualidade e seres alienígenas e extradimencionais, onde podemos saber que nem todos os seres são positivos (da Luz) e, onde, é revelado que sim, existem Federações e Confederações Intergalácticas, semelhante ao mostrado pela ficção no cinema e televisão. Neste grupo ouvi várias vezes aquilo que chamo de “desculpa furada” para a não intervenção dos pleiadianos, arcturianos, sirianos, felidaes e todas as variadas raças existentes que atuam nesse planeta indiretamente, tentando estimular nosso despertar cósmico espiritual.
Escrevi meu pensamento sobre tudo isso abaixo e peguei um trechinho das palavras do autor ou autora (a parte que fala do histórico humano, citados como exemplo).
A DESCULPA DA NÃO REVELAÇÃO DA EXISTÊNCIA E PRESENÇA ALIENÍGENA:
– Humanos não estão prontos para a verdade;
– A verdade causará convulsão social;
A melhor analogia que penso em relação à “não estamos prontos” ou, “não estamos preparados” é em relação a escravidão dos negros no passado. Imaginemos manter a escravidão dos africanos alegando que não podem ser libertos por não estarem preparados para a liberdade. Então, que se mantenha toda a barbárie porque a verdade seria “terrível”? Na época, quando se falava em libertar os escravos, era discutida as consequências socioeconômicas e toda elite reclamou, obviamente.
Teremos convulsão social, anarquia, caos. Sim, é bastante provável que haja essa ruptura da ilusória ordem, que é, como dito, ilusória. Essa ordem é para a real escravidão velada da humanidade, com toda sua destruição e sofrimento contínuo e toda irracionalidade e crueldade desse sistema. Qualquer anarquia que possa existir na relação da verdade não será pior que a condição do sofrimento contínuo, será temporário.
O sofrimento animal, por exemplo, não deve ser preservado só com a desculpa de que, se forçarmos os humanos a se tornarem veganos, eles podem se revoltar. Ofende muito a inteligência e a moral o uso dessas desculpas para a não revelação e interferência da Federação para o fim da mentira e exploração. Ver um mal acontecendo e não interferir? isso me cheira a falsa espiritualidade a qual vemos no Espiritismo, onde nos vendem que merecemos e precisamos do sofrimento para expiação e desenvolvimento. Falam muito de karma (uma falsificação espiritual que nos mantém cativos na roda interminável de reencarnações, onde nascemos, convenientemente, sem as lembranças das vidas anteriores). A tal Teologia do Sofrimento do Cristianismo, pois se baseia em culpa, castigo, resgate de pecados de vidas passadas, paraísos e infernos. Claro que isso se repete com outros termos em outras religiões (seitas), até o manso budismo dá sua contribuição aqui. A religião é parte disso, uma das principais ferramentas da escravidão humana, que falsifica a espiritualidade, invertendo seus valores.
Uma interferência extraterrestre negativa já ocorre na humanidade e fez a civilização humana ser o que é hoje, os conflitos humanos e a degradação do meio ambiente existe pelo simples fato da manutenção dos mecanismos criados para criar um sistema de dominação e poder para tais seres parasitarem a humanidade. A doutrinação religiosa e, principalmente, O SISTEMA MONETÁRIO com seu totalitarismo mercantil, que coloca um preço em tudo. Jacque Fresco (Projeto Vênus) e Peter Joseph (Movimento Zeitgeist), já mostraram a Lei Natural de um modelo de economia baseada em recursos, onde ninguém tem que pagar para viver.
Se temos uma Federação de Seres evoluídos e positivos preocupados com os humanos e seu despertar da consciência e espiritual, diante dos fatos desses humanos estarem aprisionados num sistema que os impede de todas as formas de alcançarem tal despertar, a interferência deve existir, mesmo que a certa distância e disfarçada, num simples ato de “desligar de botão” ou, “desativação da tecnologia que cria a holografia, a matrix”, como no final do filme de John Carpenter, “Eles Vivem” de 1988, quando o protagonista ‘John Nada’ destrói aquela antena que sustenta a farsa. Precisamos de um levantar das cortinas, de um abrir de portas da caverna do mito de Platão.
Se tais seres são positivos, evoluídos, da Luz, então a interferência deles não é só necessária, mas fundamentalmente positiva para a cultura terráquea, em todos os sentidos. Precisamos saber o quanto somos enganados, para que, com a verdade exposta, tenhamos o livre arbítrio de decidir o que queremos. Sim! Já ouvi muito isso sobre Livre Arbítrio e que a humanidade escolhe sua servidão, neste ponto devo discordar de Étienne de La Boétie e Jean-François Brient. Humanos são doutrinados já em suas infâncias, pelas crenças religiosas e por um sistema educacional robotizador, que os educam a serem trabalhadores obedientes e não a serem livres pensadores. Basta vermos o número de filósofos, sociólogos, pensadores e intelectuais honestos que temos no mundo, para o número de humanos que agem como gado. Se eu for listar o número de elementos utilizados para manter a humanidade cativa na ignorância este texto vira um livro. O fato é que o livre arbítrio não é respeitado e nossa servidão não é voluntária.
Já ouvi chamarem isso de vitimização, de que não devemos esperar ajuda dos ETs para nos ajudar, de que deve haver um despertar coletivo…. “cuma!?” se pra manter a humanidade cativa os dominadores fazem de tudo para justamente nos manter cativos e, isso significa que não querem que despertemos de forma alguma e…. para nos manter adormecidos eles usam de várias formas que deveriam ser desmanteladas para tal despertar… como que querem que despertemos!? É ai que desconfio dessas mensagens desses seres positivos, a lógica da moral não bate.
Não existe boa intenção dos ETs positivos? se eles não tem intenção de nos explorar, mas sim, somar e confraternizar, não tem desculpa.
Não é equivalente a história humana onde a expansão do Império Romano pela Europa e partes da Ásia e da África, o domínio egípcio sobre a região banhada pelo Nilo, o estabelecimento do Império Asteca na região hoje conhecida como México e os diversos pontos do planeta conquistados pelas nações europeias. Temos ai uma questão sobre a primeira diretriz de não interferência que se baseia puramente na história humana, história de uma humanidade afetada por um domínio negativo de uma raça extraterrestre que sempre arquitetou para que toda essa violência ocorresse.
A Federação aqui não viria trazer conflito e nem exploração, mas liberdade, confraternização e progresso, tanto tecnológico quanto espiritual. Ao mostrar como é viver num mundo livre, de amor e empatia, para humanos que não conhecem isso de verdade. Na hora que mostrar o sabor do fruto doce, eles deixarão de saborear o veneno.
Eis a carta que eu enviaria à Federação. Pois, precisamos de ajuda.